Hoje resolvi contar mais uma história de sucesso, de superação e de amor à vida. A personagem dessa história, a quem irei chamar que Isa, é cearense, solteira, cadeirante e servidora pública. Ela nasceu em Uruoca, interior do Ceará. Passou sua infância entre brincadeiras no rio, passeios pelo pomar, subindo em árvores e aprendendo a viver respeitando a natureza. Ela teve o privilégio de poder ouvir histórias contadas por seu pai e avós, deleite que a maior parte de nossas crianças hoje desconhece. Chegou o momento de ir para escola, é hora de ir para a cidade grande e Fortaleza foi o destino, mas claro que a vida no campo sempre a acompanhou.
A entrada na escola e sua vida mantiveram-se dentro do padrão que a sociedade julga como normal até os 11 anos de idade quando pequenas dificuldades para andar começaram a aparecer, acompanhadas por dores nas pernas, dificuldades para dormir e diminuição da força muscular. Isa foi levada ao médico que, por um erro diagnóstico, orientou que Isa usasse palmilhas ortopédicas, já que acreditava que o problema apresentado por ela fosse ósseo. O uso das palmilhas só fez o quaro piorar, pois fez com que ela tivesse quedas mais frequentes.
Um segundo médico consultado encaminhou Isa ao neurologista, quando foi diagnosticada Distrofia Muscular Progressiva, doença essa de ordem degenerativa. A maratona de sessões de fisioterapia, consultas médicas e internações teve início, mas ainda assim Isa continuou seu sonho, estudar. As dificuldade de locomoção para ir e vir da escola e na escola sempre a acompanharam, mas nunca foram razão para que ela desistisse de sua luta pela vitória. Conseguiu concluir o ensino superior e graduar-se como administradora de empresas. Não pense que tudo foi tranquilo, Isa isolou-se socialmente, não pelo olhar de seus colegas, mas pela insegurança e pela própria fragilidade que a progressão da doença gerou. Cicatrizes? Essas foram muitas, no corpo e na alma, cicatrizes deixadas pelas quedas, cicatrizes deixadas pelas dúvidas sobre sua capacidade. Sua família, seu médico e seus amigos foram o suporte que sempre precisou para seguir em sua jornada. Apesar do medo da progressão da doença, a frase de seu médico “Você está além de minhas expectativas” traziam força para que a meta traçada fosse alcançada.
Aos 18 anos, Isa começou sua dupla jornada, começou a trabalhar e continuou a estudar. Os questionamentos sobre suas capacidades e seus direitos foram ficando cada vez mais evidentes, mas nossa guerreira não deixou se abater e enfrentou todos os preconceitos com determinação. Entretanto Isa alimentou sentimentos como revolta e insegurança.
Hoje Isa aprendeu que humildade, compaixão, aceitação das diferenças, perseverança e atitude positiva frente aos obstáculos foram os fatores determinantes para alcançar um futuro melhor e repleto de realizações.
Um novo obstáculo surge, aos 37 anos Isa precisou usar cadeira de rodas, um novo e difícil processo teve início, mas foi superado com maestria, já que a cadeira possibilitou que Isa se deslocasse com maior facilidade e com menor risco de quedas. Em 2009, após reavaliar sua vida e suas escolhas, Isa ponderou sair de seu trabalho, pois esse a causava frustração e atribulava o cotidiano de suas irmãs, pedir aposentadoria e militar pela causa das pessoas com deficiência. Mas uma nova luz surgiu, um concurso público.
Isa foi aprovada para o cargo de administradora, entretanto foi vítima dos mesmos questionamentos sofridos em 1985 acerca de suas condições físicas e de suas capacidades laborativas. Atualmente, Isa precisa de alguns auxílios para a transferência em sua cadeira de rodas, no mais, sua rotina é tranquila e sem grandes dificuldades. Entretanto, ainda hoje, apesar de amparada por uma legislação que assegura seus direitos, Isa precisa provar diariamente sua capacidade e quebrar preconceitos.
Isa é uma vitoriosa, assim como sua família e seus amigos que sempre a acompanharam e permitiram que ela sonhasse e construísse um futuro melhor através da educação e do exercício da cidadania. A escola certamente foi peça fundamental desse quebra cabeça da vida, onde cada peça precisou ser delicadamente trabalhada. Certamente seus colegas de escola tornaram-se adultos que respeitam o próximo e são capazes de enxergar a essência do outro, significando o que Sassaki sempre acreditou “(…) a diversidade humana quando devidamente valorizada produz relações positivas de amizade, respeito mútuo, convivência positiva, aprendizado, em que todos saem ganhando. Se não há contato com a diversidade, a visão é limitada, restrita”.