O que a Síndrome de Down me ensinou sobre a vida

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Confira o relato do ex-jogador de futebol e atual senador Romário sobre sua relação com a filha, Ivy.

Há 10 anos minha vida deu uma guinada. Era 2005 e eu, aos 40 anos, me surpreendi com o nascimento de uma filha com síndrome de Down. Meu desconhecimento sobre o assunto era tão grande que sofri por alguns minutos. Foram poucos, graças a Papai do Céu. O amor por aquela criança dissipou rapidamente qualquer sentimento ruim.

Naquele momento, as notícias sobre o assunto não foram as mais razoáveis. “Romário enfrenta drama com nascimento do sexto filho”, escreveu um jornalista. Enquanto inúmeras outras pessoas cochichavam com preconceito sobre as características da síndrome. Definitivamente, o mundo era outro.

Muitos acharam que eu esconderia minha princesa, mas, sendo um homem público, chamei uma coletiva para falar sobre a Ivy. “Hoje o assunto aqui não é futebol, é síndrome de Down”, anunciei aos jornalistas que ouviram com espanto. Em abril daquele mesmo ano, me despedi da Seleção Brasileira, com um gol em um jogo contra a Guatemala. Havia ampla cobertura da mídia e, na comemoração, exibi a camisa da causa: “Tenho uma filhinha Down que é uma princesinha!” Foi assim, apresentando minha filha ao mundo que mudei muita gente, assim como mudei a mim próprio.

Ivy veio ao mundo com uma responsabilidade enorme, mudar o Romário. Ela me deu tranquilidade e pude me tornar um cara menos egoísta, mais calmo e, assim, melhorar minha relação com os meus outros filhos e o trato com as pessoas. Ela fez isso tão bem que, junto com esse pai babão, mudou milhões de pessoas. Recebo muitas mensagens de pais que ficaram tranquilos em receber a notícia do nascimento de um filho com Down. Certa vez, um médico comunicou a uma mãe que ela havia dado luz a uma criança como a filha do Romário. Ela sorriu com emoção e me contou, tempos depois.

Esse poder é da Ivy. Quem a conhece sabe de sua luz, alegria, inteligência e amor que encanta a todos a sua volta. Graças a ela, hoje sou uma pessoa mais sensível, paciente, compreensivo. Ela me deu um novo sentido para viver.

Por causa dela, resolvi lutar por um mundo melhor para as pessoas com deficiência. Nestes cinco anos no parlamento, posso dizer, modestamente, que já deixei minha marca.

Em apenas seis meses de mandato, consegui fazer importantes mudanças na legislação em favor das pessoas com deficiência. Uma delas está relacionada ao Benefício de Prestação Continuada. Também conhecido como BPC, o benefício garante o auxílio de um salário mínimo à pessoa com deficiência de baixa renda. A mudança na Lei Orgânica de Assistência Social (Lei n° 8.742/1993) prevê que a contratação de deficientes físicos como estagiários não mais acarretará na suspensão ou cancelamento do BPC. Como aprendiz, eles poderão receber, por até dois anos, a remuneração e o benefício simultaneamente. Já no caso do deficiente ser contratado ou se tornar um microempreendedor individual, o benefício será apenas suspenso. Desta forma, quando a atividade remunerada cessar, o beneficiário voltará a receber automaticamente o auxílio, sem necessidade de nova perícia.

Além disso, foi engrandecedor participar da construção do Plano Nacional de Educação e tantos outros projetos para o País. Agora, me honra ser o relator da Lei Brasileira de Inclusão. E tudo isso, apenas uma pessoa é responsável. Quem diria que a síndrome de Down me daria tantas novas possibilidades na vida.

Hoje eu agradeço a Ivy por tudo. Especialmente pela oportunidade de lutar pela sociedade. Por contribuir para melhorar a vida de tantas pessoas com síndromes, deficiências, doenças raras e tantas outras incapacitantes.

Com 10 aninhos, minha filha ainda não tem dimensão de sua importância para este mundo, mas um dia terá.

Mais sobre meu caminho com a Ivy, você lê aqui.

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