Enquanto isso, na mídia escrita e nos telejornais: “Pessoa deficiente cai nos trilhos do metrô”, “pessoas deficientes estão frequentando sala normal”, “idoso inválido é abandonado pela família”, “deficientes físicos estão cada vez mais inclusos no mercado de trabalho”, “dona fulana é cega, mas mora sozinha”… E ali na esquina, podemos ouvir: “Vou ajudar o ceguinho atravessar a rua”, “ali, bem do lado deficiente”, “nossa, que cruz, um filho deficiente”, “tadinho, ele é surdo-mudo”…
Podem me chamar de chata, de implicante, do que quiserem – meu filho faz isso com frequência –, mas a forma como tratamos ou nos expressamos em relação ao outro faz toda a diferença. A construção de uma sociedade inclusiva é permeada pelo uso correto da linguagem. Palavras e termos incorretos são falados, escritos e anunciados, mas poucas vezes as pessoas param para pensar se o que ouvem ou leem está tratando o outro com respeito e sem discriminação. Por conta disso, resolvi hoje falar sobre esse tema. A proposta é pensar nos termos que mais ouço ou leio, seja na rua, nos jornais, na internet, em telejornais, da boca de profissionais e leigos, e discutir a forma mais adequada de serem utilizados.
Uma das frases que me incomoda é “fulano de tal é deficiente, mas vai todos os dias para o trabalho”. Primeiro: ninguém é deficiente. Logo, o correto é “pessoa com deficiência”, termo que começou a ser utilizado na década de 1990. E não me venha com a história de “portador de deficiência”, ninguém porta a deficiência, portamos bolsa, guarda chuvas, mas deficiência, não. Além do mais, nessa frase há um preconceito, uma vez que exclui as pessoas com deficiência de saírem de casa. Fica subentendido que as pessoas com deficiência não saem e que fulano, especificamente, sai. É correto dizermos que “fulano de tal é uma pessoa com deficiência E sai todos os dias de casa”.
E a essa frase, junto muitas outras com o mesmo teor: “ela é cega, MAS é inteligente” – como se o fato de ela ser cega automaticamente descartasse sua inteligência. Que tal trocarmos por “ela é cega E inteligente”?
“Não, ele é normal, deficiente é o outro filho”. Quem já ouviu essa frase? Todos os preconceitos do mundo estão nela. Primeiro: esse conceito de “normal” sedimenta a ideia de que uma pessoa com deficiência não é normal. O outro filho não é deficiente, ele é uma pessoa com deficiência. Vamos trocar essa frase por “não, ele é o filho sem deficiência, o outro filho é uma criança com deficiência”?
Palavras com o sufixo “inho” me incomodam muito, como ceguinho, surdinho, mudinho e muitos outros “inhos” que você quiser aqui adicionar. Você não gosta que digam que você é bonitinho (a), né? Esse sufixo traz implícito que a pessoa não é tida como completa. É muito mais adequado falarmos cego, pessoa cega, pessoa com deficiência visual ou, no caso do “surdinho”, surdo e pessoa com deficiência auditiva. E não me venha com a história de “surdo-mudo”. Ser surdo não implica, necessariamente, que a pessoa também seja muda, entendido?
Ouvir ou ler as palavras “mongoloide”, “excepcional”, “aleijado”, “leproso”, “inválido”, “epilético”, “retardado mental” e “doente mental” podem me causar urticárias. Primeiro, quero explicar a origem da palavra “mongoloide”. O cientista que se apropriou do termo observou que as crianças nascidas com síndrome de Down apresentavam sinais fenotípicos como olhos amendoados e feições asiáticas, embora seus pais fossem caucasianos, e apresentavam um déficit intelectual. Como todo preconceito isso é bobagem, mas naquela época as pessoas asiáticas, sobretudo as da tribo mongol, eram tidas como sem ou pouca inteligência. Os mongóis não são e nunca foram pouco inteligentes. O correto é dizer que as pessoas nascidas com essa anomalia genética descoberta por John Langdon Down são, simplesmente, pessoas com síndrome de Down.
Eu poderia passar horas falando sobre terminologia, mas para facilitar nossas vidas, vou fazer um pequeno glossário. Tenho certeza que esquecerei muitas palavras – quem puder, me ajude a completar a lista.
– Cadeirante
– Cadeira de rodas motorizada
– Cego; pessoa com perda visual
– Escola regular ou escola comum – não é correto dizer escola normal
– Libras e não LIBRAS – sigla para Língua de Sinais Brasileiro (termo preferível a Língua Brasileira de Sinais)
– Muletante (termo coloquial) – para pessoas que utilizam muletas para se locomover
– Pessoa com deficiência
– Pessoa com deficiência física
– Pessoa com deficiência mental
– Pessoa com epilepsia
– Pessoa sem deficiência
– Síndrome de Down
– Sistema Braille
– Surdo, pessoa com perda auditiva